Então, num instante, o polvo, o caranguejo e o peixe transformaram-se numa orquestra.
O peixe com as suas barbatanas batia palmas na água.
O caranguejo subiu para uma rocha e com as suas tenazes começou a tocar castanholas.
O polvo trepou para cima dos rochedos e esticando muito,
sete dos seus oito braços prendeus pelas pontas com as suas ventosas na pedra
e com o braço que tinha ficado livre começou a tocar guitarra nos seus sete braços.
Depois pôs-se a cantar.
Então a menina saiu da água, subiu para uma rocha e principiou a dançar.
E a água junto dos seus pés ia e vinha e bailava também.
E a água junto dos seus pés ia e vinha e bailava também.
E a água junto dos seus pés ia e vinha e bailava também.
E a água junto dos seus pés ia e vinha e bailava também.
E a água junto dos seus pés ia e vinha e bailava também.
E a água junto dos seus pés ia e bailava também.
Escondido atrás do rochedo, o rapaz, imóvel e calado, olhava.
A CANTIDADE SE FORMEOU UMA 되는데 de mais de sete vidas.
a dança acabaram, o polvo
pegou na menina e com os seus oito braços
muito escuros pôs-se a embalá-la.
Vêm em maré alta,
são horas de irmos embora, disse o caranguejo.
Vamos, disse o polvo.
Chamaram o peixe
e puseram-se os quatro a caminho.
O peixe ia à frente a nadar com a menina
ao lado, depois vinha o polvo
e por fim o caranguejo,
sempre com um ar muito desconfiado
e furioso.
Foram indo por entre as areias e as rochas
até que chegaram a uma gruta onde entraram
os quatro. O rapaz quis ir atrás
deles, mas a entrada da gruta era muito
pequenina e ele não cabia.
E como a maré estava a subir,
teve que se ir embora, pois se ele
ficasse, morria afogado.
Foi para casa
muito espantado com o que tinha visto
e durante esse dia não pensou
noutra coisa.
A CIDADE NO BRASIL
Na manhã seguinte, mal acordou, foi a correr para a praia.
Foi pelo mesmo caminho da véspera.
Tornou a esconder-se atrás das duas pedras,
espreitou e ouviu as mesmas gargalhadas da véspera.
A menina, o caranguejo, o polvo e o peixe
estavam a fazer uma roda dentro de água.
Estavam divertidíssimos.
O rapaz, louco de curiosidade, não conseguiu ficar quieto mais tempo.
Deu um salto e agarrou a menina.
Ah, que desgraça! Gritou ela.
O polvo, o caranguejo e o peixe tinham desaparecido,
aterrorizados num abrir e fechar de olhos.
O polvo, o caranguejo, o peixe, acudam, me salvam!
Gritava a menina.
Então, apesar de estarem cheios de medo,
saíram de trás das algas onde se tinham escondido
e começaram a tentar salvar a menina.
Faziam o que podiam.
O polvo trepava pelas pernas do rapaz.
O caranguejo, com as suas tenazas, beliscava-lhe os pés.
E o peixe mordia-lhe as canelas.
Mas o rapaz era maior e tinha mais força.
Deu-lhes alguns pontapés e fugiu para longe com a menina,
que continuava a chamar.
O polvo, o caranguejo!
O peixe!
Não grites, não chores, não te assustes, dizia o rapaz.
Eu não te faço mal nenhum.
Eu sei que me vais fazer mal.
Que mal é que eu hei de fazer a uma menina tão pequenina
e tão bonita?
Vais-me fritar, disse a menina do mar.
E pôs-se outra vez a chorar e a gritar.
O polvo, o caranguejo, o peixe!
Eu?
Fritar-te para quê?
Que ideia tão esquisita, disse o rapaz, espantadíssimo.
Os peixes dizem que os homens fritam tudo quando te apanham.
O rapaz pôs-se a rir e disse.
Isso são os pescadores.
Os pescadores é que apanham os peixes para os fritar.
Mas eu não sou um pescador.
E tu também não és um peixe.
Não te quero fritar.
Nem te quero fazer mal nenhum.
Só te quero ver bem porque nunca na minha vida vi
uma menina tão pequenina e tão bonita.
E quero que me contes quem és tu e onde vives
e o que fazes aqui no mar e como é que te chamas.
Então a menina parou de gritar, limpou as lágrimas,
penteou e alisou os cabelos com os dedos das mãos
a fazerem de pente e disse.
Vamos sentar-nos os dois naquele rochedo e eu conto tudo.
Prometes que não foges?
Prometo.
Prometo.
Sentaram-se os dois um em frente do outro e a menina contou.
Eu sou uma menina do mar.
Chamo-me menina do mar.
E não tenho outro nome.
Não sei onde nasci.
Um dia uma gaivota trouxe-me no bico para esta praia.
Pôs-se numa rocha na maré vaza e o polvo, o caranguejo e o peixe
tomaram conta de mim.
Vivemos os quatro numa gruta muito bonita.
O polvo arruma a casa, alisa a areia, vai buscar a comida.
É de nós todos o que trabalha mais porque tem muitos braços.
O caranguejo é o cozinheiro.
Faz caldo verde com limos, sorvetes de espuma,
salada de algas, sopa de tartaruga, caviar e muitas outras receitas.
É um grande cozinheiro.
Quando a comida está pronta, o polvo põe a mesa.
A toalha é uma alga branca e os pratos são conchas.
Depois, à noite, o polvo faz a minha cama com algas muito verdes e muito macias.
Mas o costureiro dos meus vestidos é o caranguejo e é também o meu orives.
Ele é que faz os meus colares de búzios, de corais e de pérolas.
O peixe não faz nada porque não tem mãos, como eu,
nem braços com ventosas como o polvo, nem braços com tenazos como o caranguejo.
Só tem barbatanas e as barbatanas só servem para nadar.
Mas é o meu melhor amigo.
Como não tem braços, não me põe de castigo.
É com ele que eu brinco.
Quando está maré vaza, brincamos nas rochas.
Quando está maré alta, damos para o sol.
Passeios no fundo do mar.
Tu nunca foste ao fundo do mar e não sabes como lá tudo é bonito.
Há florestas de algas, jardins de anémonas, prados de conchas.
Há cavalos marinhos suspensos na água com um ar espantado com pontos de interrogação.
Há flores que parecem animais e animais que parecem flores.
Há grutas misteriosas.
Azuis escuras, rochas verdes.
E há planícies sem fim de areia fina, branca, lisa.
Tu és da terra.
E se fosse só o fundo do mar?
Morrias. Afogado.
Mas eu sou uma menina do mar.
Posso respirar dentro de água como os peixes.
E posso respirar fora de água como os homens.
E posso passear pelo mar todo.
E fazer tudo quanto eu quero e ninguém me faz mal.
Porque eu sou a bailarina da grande raia.
E a grande raia é a dona destes mares. É enorme.
Tão grande que é capaz de engolir um barco com dez homens dentro.
Tem cara de má e come homens e peixes.
E está sempre com fome.
A mim não me come porque diz que eu sou pequena demais.
E não sirvo para comer, só sirvo para dançar.
E a raia gosta muito de me ver dançar.
Quando ela dá uma festa convida os tubarões, as baleias e sentam-se todos no fundo do mar.
E eu danço em frente deles até de madrugada.
E quando a raia está triste ou mal disposta eu também tenho de dançar para a distrair.
Por isso eu sou a bailarina do mar.
E faço tudo quanto eu quero e todos gostam de mim.
Mas eu não gosto nada da raia e tenho medo dela.
Ela detesta os homens.
E também não gosta nada dos peixes.
Até as baleias têm medo dela.
Mas eu posso andar à vontade no mar.
E ninguém me faz mal e ninguém me come.
E ninguém me faz mal porque eu sou a bailarina da raia.
E agora que já te contei a minha história leva-me outra vez para o pé dos meus amigos.
Que devem estar aflitíssimos.
O rapaz pegou na menina do mar com muito cuidado na palma da mão.
E levou-a outra vez para o sítio de onde a tinha trazido.
O polvo, o caranguejo e o peixe.
Lá estavam os três a chorar abraçados.
Estou aqui!
Gritou a menina do mar.
Mal a viram, pararam de chorar e atiraram-se os três como três cães aos pés do rapaz.
E começaram outra vez a mordê-lo e a picá-lo.
O polvo com os seus oito braços chicoteava-lhe as pernas.
Estejam quietos!
Parem!
Não me façam mal!
Ele é meu amigo e não me vai fritar!
Gritou-lhes a menina do mar.
O polvo, o caranguejo e o peixe interromperam a pancadaria espantadíssimos com estas palavras.
O rapaz baixou-se e pôs a menina na água ao pé dos seus três amigos
que davam saltos de alegria e muitas gargalhadas.
A maré estava a subir.
E o rapaz tinha que se ir embora.
Pediu à menina do mar e ao polvo e ao caranguejo e ao peixe
para voltarem no dia seguinte, à mesma hora, àquele mesmo sítio.
Tenho tanta curiosidade da terra, disse a menina.
Amanhã, quando aqui viés, traz-me uma coisa da terra.
E assim ficou combinado.